terça-feira, 26 de janeiro de 2021

O quarto

As cores invadiram o quarto sem pedir licença.
As coisas todas escolheram os seus lugares inapropriados para estarem por algum tempo, não se sabe quanto.
Empurraram para fora dos espaços papéis inúteis, pedaços de histórias que foram.
Das inutilidades que permaneceram, apenas as que davam gosto de olhar ou sentir de olhos fechados.

E tudo ficou assim, como fosse imutável, sem ser, já que nada é.
Harmonia, surpreendentemente autônoma, de geração espontânea.

Até a vista da janela, que da a visão para um muro ainda muito branco e lembra o cal de uma casa grega nunca vista, compõe, incorpora.

O pedaço do céu, contém os ramos de uma árvore que está do outro lado do muro. 
É por causa dessa árvore que não há silêncio absoluto até o anoitecer pois parece que por algum motivo todos os pássaros dos arredores vieram pousar e esvoaçar, demoradamente; e vão ficando por perto tão barulhentos quanto escondidos.

Choveu forte há pouco e o calor evaporou.
O frescor sutil parece apontar para as germinações todas do pequeno quintal. 
O poeta, urgente de flores e folhagens, enquanto o mar parece longe,  escreve, porque o mundo cabe aqui e agora.